CRISE E RUPTURA NA MAÇONARIA BRASILEIRA: O CASO DO GOMG E DO GOB
- Maçonaria com Excelência
- há 12 horas
- 9 min de leitura
UM BREVE RESUMO SOBRE AS CAUSAS QUE LEVARAM O GRANDE ORIENTE DE MINAS GERAIS A DESVINCULAR DO GRANDE ORIENTE DO BRASIL, RESULTANDO NA FUNDAÇÃO DA COMAB
Por Geraldo Marcelo Lemos Gonçalves[1]
CRISE E RUPTURA NA MAÇONARIA BRASILEIRA: O CASO DO GOMG E DO GOB
“... eu Cavei fundo e encontrei essas verdades, mas minhas mãos ficaram sujas de tanto cavar. E para lavar minhas mãos, preciso abrir mãos delas, revela-las. Se eu mantê-las restritas às minhas mãos, minhas luvas nunca mais serão brancas. Então olha-as, de perto, de longe, de relance, ou mesmo feche os olhos, mas elas estarão aqui, para quem tiver olhos para vê-las, se chocarem com suas convicções, faça sua escolha com sabedoria. Mas se escolher as convicções, por favor, não me blasfeme, eu apenas as encontrei e as revelei. Foram outros que as fizeram e as ocultaram, e agora que elas estão expostas, talvez surjam alguns dispostos a tentar encobri-las novamente, com mentiras.”
Kennyo Ismail
O viés histórico é natural do ser humano, para ser o mais imparcial possível, é necessário ler e estudar todo o contexto relativo ao fato em voga, confrontar os contraditórios, e para perceber se foi possível externar a verdade, é necessário aguardar a validação dos pares.
A minha intenção não causar mal-estar em nenhum irmão ou instituição, é apenas tornar público um fato histórico para prevenir que ele não se repita.
Fundado em 1822, o Grande Oriente do Brasil (GOB) é a mais antiga potência maçônica brasileira em atividade e, por um longo período, foi a única instituição maçônica regular do Brasil a possuir múltiplos tratados de reconhecimento, em suas fileiras sempre foi repleta de excepcionais Maçons Brasileiros.
Contudo, no início do século XX, tensões internas e externas vinculadas principalmente ao amálgama que existia entre Supremo Conselho do Rito Escocês Antigo e Aceito (SC33 de Jacarepaguá) levou a “1º Grande Cisão da Maçonaria Brasileira em 1927.
As Grandes Lojas Estaduais Soberanas (GLES) fundaram a Confederação da Maçonaria Simbólica do Brasil (CMSB) em 27 de junho de 1966, essa organização nasceu confederativa, ao contrário do GOB que sempre foi federalista.
Para explicar melhor, vamos a dois conceitos federação e confederação. São formas de organização política que envolvem a associação de estados ou entes políticos, mas com diferenças significativas em relação à soberania e à forma de organização.
Na federação, os estados membros perdem parte da sua soberania e se unem em um estado federal único, enquanto na confederação, os estados mantêm a sua soberania e se unem por meio de um tratado, formando uma associação de estados.
Trazendo para nosso escopo, as Grandes Lojas Estaduais tinham sua soberania respeitada e se aglutinaram formando a CMSB por meio de tratados, por sua vez, os Grandes Orientes Estatuais (GOEs) tinham uma soberania reduzida por causa do pacto federativo com o GOB.
O modelo confederado das GLES serviam como modelo de soberania almejado pelos GOEs para questionarem à centralização de poder e atos nada convencionais ao meio maçônico praticados pelo poder central do GOB.
O desligamento do Grande Oriente de Minas Gerais (GOMG) do Grande Oriente do Brasil (GOB) ocorrido em março de 1973 foi um evento significativo na história da maçonaria brasileira e em especial na maçonaria montanhesa. Esse fato chancelou a “2º Grande Cisão da Maçonaria Brasileira”. Muitos se enganam se acham que foi uma decisão feita de “cabeça quente” por alguns irmãos do “rincão das alterosas”.
Conforme relata Souza (2016), o cerne da crise estava no desejo de soberania dos Grandes Orientes Estaduais, que se sentiam cada vez mais subordinados a um centro distante e alheio às realidades locais. A crescente insatisfação dos Grandes Orientes Estaduais com o poder centralizador do GOB foi combustível para o movimento de emancipação das potências maçônicas regionais (SANTOS, 2017, p. 88). Em 1973, uma eleição interna do GOB, permeada por acusações de irregularidades, foi o estopim que culminou na ruptura definitiva.
De acordo com Silva (2018), o manifesto assinado em 1962 por cinco Grão-Mestres estaduais reivindicava maior autonomia para os GOEs, revelando uma tensão latente no seio da administração do GOB. Essa insatisfação foi intensificada pela percepção de que o GOB não respeitava a soberania dos GOEs, tratando-os como simples departamentos subordinados.
Dez anos depois, visando à eleição geral do GOB que aconteceria no primeiro semestre de 1973, a maioria dos Grão-Mestres dos GOEs reuniram no Grande Oriente de São Paulo no dia 19 de abril de 1972 para lançar uma chapa de oposição ao candidato apoiado pelo atual Grão-Mestre Geral do GOB, o irmão Moacir Arbex Dinamarco, esse ato ficou conhecido como “Proclamação de São Paulo”.
Corroborando, segundo Ismail (ISMAIL, 2021, p. 223 a 249), o processo eleitoral interno do GOB na década de 1970 foi marcado por fortes acusações de fraudes e manipulações, contribuindo diretamente para o movimento de ruptura dos Grandes Orientes Estaduais. Essa eleição eivada de vícios para Grão-Mestre Geral e Grão-Mestre Geral Adjunto do GOB foi a “gota d'água”.
“Em 1973 o GOB mais uma vez sofre uma cisão, fruto de problemas em eleições. Concorrem os irmãos Athos Vieira de Andrade (1928-2010) pela oposição e Osmane Vieira Rezende (1899-1986) pela situação. Em um primeiro momento o Ir Athos recebeu mais votos, mas após várias impugnações, o irmão Osmane foi declarado vencedor. Isso provocou uma cisma que criou a atual COMAB (Confederação da Maçonaria Simbólica do Brasil) que engloba os Grandes orientes Independentes. Magalhães, pág. 91
As divisas da campanha da oposição eram:
Mudança da sede do GOB para Brasília;
Reestruturação administrativa;
Consolidação econômico-financeira do GOB e dos GOEs;
Aprimoramento das instituições assistenciais aos maçons e seus familiares;
Unificação de maçonaria brasileira;
Melhoria das relações internacionais, pois o GOB era considerado uma potência espúria pela maioria das Grandes Lojas e Grandes Orientes regulares no mundo.
O quadro eleitoral ficou arquitetado da seguinte forma, o atual Grão-Mestre Adjunto Geral do GOB, irmão Osmane Vieira Resende, era candidato da situação a Grão-Mestre Geral do GOB ladeado pelo seu candidato a Grão-Mestre Adjunto Geral do GOB, o irmão Osires Teixeira.
A oposição era encabeçada pelo irmão Athos Vieira de Andrade, então Grão-Mestre do Grande Oriente de Minas Gerais (federado ao GOB) e seu candidato a adjunto era o irmão Raphael Rocha, então Grão-Mestre do Grande Oriente do Rio de Janeiro (federado ao GOB).
O ex-Grão-Mestre Geral do GOB na gestão anterior, o irmão Cyro Werneck, tinha tanta certeza no triunfo da oposição que enviou uma carta em abril daquele ano parabenizando o irmão Athos pela vitória 30 dias antes de pleito. Essa percepção se deve por causa dos grandes descontentamentos explicitados pela imensa maioria dos irmãos e também pela aperreação com a situação vivida há anos com o poder central do GOB.
A eleição geral do GOB foi realizada em março 1973, as apurações foram lentas, naturalmente, devido à grande extensão territorial do Brasil e ao processo de recebimento do material da eleição das lojas que eram transportados pelos correios. Após as apurações, o resultado oficial dava a vitória de Osmane, com 2129 votos, ante 1107 votos dados a Athos, enquanto Osires Teixeira também vencia, com 2046 votos, diante de 1180 de Raphael Rocha. Segundo a oposição, entretanto, o resultado “extraoficial” consignava 7175 votos para Athos, contra 3820 para Osmane; e 7195 para Raphael, contra 3794 para Osires.
Ocorre que, nas sessões do egrégio Tribunal Superior Eleitoral do GOB conseguiram dobrar a lei no sentido de anular aproximadamente 66% dos votos, em sua maioria da oposição, das 703 lojas que haviam enviados atas da eleição, o tribunal anulou os votos de pelo menos 463 lojas, ou seja, aproximadamente 66% dos votos.
As loja com votos anulados foram assim justificados em linhas obliquas:
109 lojas tiveram votos anulados por envio fora do prazo;
125 lojas por estarem em débito com o GOB;
176 lojas por cadastro vencido;
53 lojas por outras razões.
A maior polêmica, foi que mais de 6 mil votos de Athos foram anulados, enquanto Osmane perdeu menos de 2 mil. Todo o processo ocorreu em um ambiente bastante agitado, já que os representantes da chapa oposicionista, na apuração alegavam fraudes na anulação de atas eleitorais, com parcialidade do TSE do GOB, em favor dos candidatos oficiais. A oposição protocolou dois pedidos de anulação da eleição, ambos ignorados pela corte (Figuras 01,02,03,04,05, 06, 07 e 08).
O Grão-Mestre Geral do GOB, o irmão Moacyr Arbex Dinamarco, em final de mandato convocou os Grão-Mestres dos GOEs para uma reunião da Soberana Grande Congregação, os fatos ocorridos nessa assembleia fizeram a maioria dos Grão-Mestres Estaduais se retirarem. Ato contínuo, se reuniram em um hotel, redigiram uma proclamação para servir de gatilho para a fundação do Colégio de Grão-Mestres.
Naquele 03 de maio de 1973, o Grão Mestre Geral do GOB promoveu uma série de suspenções de Grão-Mestres Estaduais e seus Adjuntos, intervenções em GOEs. E para finalizar, o escândalo da manipulação da eleição para Grão-Mestrado Geral foi parar nas revistas e jornais do mundo profano.
A imprensa profana repercutiu com grande interesse o escândalo envolvendo a eleição de 1973, revelando ao público em geral os conflitos internos da maçonaria brasileira (MARTINS, 2019). A imagem pública da maçonaria sofreu forte abalo com essas exposições.
Em agosto de 1973, 10 Grandes Orientes a saber: São Paulo, Minas Gerais, Ceará, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Paraná, Distrito Federal, Mato Grosso, Santa Catarina e Rio de Janeiro, que haviam se desligado do GOB, reuniram em Belo Horizonte e Fundaram o Colégio de Grão-Mestres da Maçonaria Brasileira, que posteriormente, mudaria seu nome para Confederação Maçônica do Brasil (COMAB).
A COMAB foi fundada com o objetivo de agrupar e organizar os Grandes Orientes Independentes, que surgiram, principalmente, nas cisões ocorridas dentro dos Grandes Orientes Estaduais ligados ao Grande Oriente do Brasil (GOB) no ano de 1973. Sendo considerada Maçonaria Regular, pois pratica todas as regras da maçonaria universal, bem como integra as demais confederações internacionais e regulares pelo mundo.








REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
AZEVEDO, Fernando de. As ideias e as instituições brasileiras. 5. ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1971.
BETHELL, Leslie. Brasil: uma história. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1997.
CARVALHO, A de W. Pequena História da Maçonaria no Brasil. REHMLAC. 2010; Vol.: 2, Nº 1, p. 30 - 58.
CASTELLANI, José. História do Grande Oriente do Brasil. Brasília: Grande Oriente do Brasil, 2001.
CASTELLANI, José. Maçonaria: história e doutrina. São Paulo: Editora A Trolha, 1993.
COMAB. História da COMAB [online]. Belo Horizonte: Confederação Maçônica do Brasil; 2024. [Citado 2024 maio 27]. Disponível em:https://comab.org.br/historia-da-comab/.
FARIA, Ricardo L. de. O papel da Maçonaria na independência e na organização política do Brasil. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 10, n. 19, p. 87-104, 1990.
GOMG. Nossa História [online]. Belo Horizonte: Grande Oriente de Minas; 2024. [Citado 2024 maio 27]. Disponível em: https://gomg.org.br/nossa-historia/
ISMAIL, Kennyo. Maçonaria brasileira: a história ocultada. Vol. I. 1. ed. Brasília: No Esquadro, 2021.
MACEDO, João Bosco. Maçonaria brasileira: a história ocultada – Vol. I. 2. ed. Belo Horizonte: GLOMIG, 2008.
MACEDO, João Bosco. Maçonaria brasileira: a história ocultada – Vol. II. 2. ed. Belo Horizonte: GLOMIG, 2008.
MAGALHÃES, Paulo Maurício de Morais. História dos Ritos Maçônicos Praticados no Brasil. Tremembé, SP: do Autor, 2019. p. 91.
OLIVEIRA, K M S. O Surgimento dos “não Alinhados” em meio à guerra. In: Oliveira, K M S. Maçonaria Brasileira: a história ocultada. 1º edição. Brasília: No Esquadro; 2021. p. 223 - 250.
PEREIRA, Luiz Edmundo. A maçonaria e a formação do Estado brasileiro. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986.
SC33. Histórico. Disponível em: https://sc33.org.br/index.php/historico/. Acesso em: 1 maio. 2025.
SILVA, Hélio. A Maçonaria e o poder. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1976.
SOUZA, Jessé. A elite do atraso: da escravidão à Lava Jato. Rio de Janeiro: Leya, 2017.
Nota de rodapé
[1] Bacharel em Odontologia (UFVJM, 1999), Especialista em Odontopediatria (UFVJM, 2003), Especialista em Ortodontia (UFVJM, 2010), Especialista em Implantodontia (UNIASSELVI, 2013), Habilitação em Sedação Consciente e Analgesia Inalatória (ABRASCO, 2015), Especialista em Maçonologia: História e Filosofia (UNINTER, 2018), Bacharel em Administração de Empresas (UNINTER, 2022), Mestre em Prótese Dental (SLMANDIC, 2023). Mestre Maçom Instalado, membro da A. R. L. M. Estrela Maior de Turmalina nº 243 do G. O. M. G., Membro Correspondente da A.R.L.S. Virtual Lux in Tenebris n° 47 da G. L. O. M. A. R. O. N., Grau 09 do R. E. A. A. e M. R. do Real Arco.
Comments