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A CONSTRUÇÃO DO MAÇOM

Por Luiz V. Cichoski


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A CONSTRUÇÃO DO MAÇOM

 

A CONSTRUÇÃO DO MAÇOM
Imagem ilustrativa gerada por IA

I. INTRODUÇÃO

O maçom é um homem, um ser humano; o homem é um ser contaminado pela vida; a vida é um fenômeno multifatorial que se estabeleceu em um sincronismo físico-químico, isto é, resultado de uma sequência de reações autoestimuladas desenvolvidas em um ambiente ‘controlado’ — a célula [1],[2],[3],[4],[5] — sejam as sexuais ou as somáticas.

 

Tanto o fenômeno multifatorial como o ambiente ‘controlado’ foram se especificando e especializando ao longo do tempo e das infinitas experiências[6],[7],[8] das quais a vida participou ou se adaptou; continentes limitados com diferentes conteúdos básicos foram se associando, alcançando a construção de estruturas complexas interligadas e interdependentes[9],[10],[11].

 

A dimensão química[12],[13]-funcional[14],[15],[16] experimentou um progresso inimaginável; uma miríade de processos e substâncias foram processadas; as vantagens e desvantagens privilegiaram alguns conjuntos e comprometeram, definitivamente, a outros.

 

Decorrentes destes diferentes arranjos, capacidades foram desenvolvidas; de coacervos/coacervados[17],[18] incaracterísticos à organismos multicelulares organizados em células com diferentes e oportunas matrizes ou funções, a vida transladou-se do ambiente aquático para o ambiente seco, inicialmente estatizada na flora, alcançando a mobilidade animal nos diferentes ambientes: aquoso, terrestre e aéreo.

 

O ambiente terrestre foi se modificando e permitindo diferentes experimentos vitais ao longo dos incontáveis diferentes momentos sucedidos; prioritariamente secos, aquosos ou gélidos. Pangeia ou afastamento da calota na formação dos continentes como hoje conhecidos.

A cronologia que precisamos utilizar é a dos bilhões de anos[19] separando os coacervados dos animais maiores, entre os quais o homem, este, aparentemente, como a última obra da natureza[20] ou a obra-prima do criador[21].

 

O funcionamento fisiológico adaptativo permitiu que diferentes etapas estruturais fossem ultrapassadas, ou melhoradas, ou evoluídas.

 

Parece razoável acreditar que a partir dos sólidos e pétreos documentos, verdadeiras ‘old charges evolutivas’ [22],[23],[24],[25],[26],[27],[28],[29] que os primeiros animais da nossa linhagem — os primatas hominídeos[30] — assim como outras linhagens mantiveram dois instintos básicos: o da sobrevivência e o da procriação.

 

A sobrevivência constituindo um objetivo individual, enquanto a procriação exemplificando o alvo coletivo.

 

A procriação exala instintividade como resultado do efeito hormonal ‘automática e concomitantemente’ desenvolvido ao longo da jornada organizacional e desenvolvimentista da estrutura orgânica, montada a partir de múltiplos órgãos; ou seja, dos arranjos apropriados dos críticos e precisos elementos limitados, nem mais, nem menos — como alguns dos elementos listados na tabela periódica e algumas substâncias inorgânicas e orgânicas — como conteúdos básicos — membranas, organelas e divisões celulares.

 

Na execução e concretização destas tarefas — sobrevivência e procriação — se desenvolveu e operacionalizou o sistema nervoso. Temos elementos que descrevem esta especialização gradual.[31],[32],[33],[34],[35],[36] 

 

Ao longo dos eventos que culminaram no homem ‘moderno’, do aqui e agora, houve um período básico onde a estrutura neuronal disponível era simples, mas suficiente para a sobrevivência e procriação; nos referimos ao tronco cerebral, composto de estruturas básicas — bulbo, ponte e mesencéfalo[37] — com comandos simples associados ainda hoje aos automatismos de ‘luta-fuga’ e ‘congelamento’; o importante era saber encontrar o alimento sem se mostrar como alimento para outros.

 

Estamos diante do homem caçador-coletor cujo trabalho principal foi o da sobrevivência; especializado no trabalho instintivo-braçal com volume cerebral ao redor de 400cc, exemplificado em ‘Lucy’, 3,5 milhões de anos atrás.

 

Melhoria significativa agregou-se com o desenvolvimento do tronco cerebral que estruturou o sistema límbico — o hipotálamo, o tálamo, a área pré-frontal e o rinencéfalo (sistema olfativo)[38] — elementos que capacitaram a experiência do ‘sentir’[39],[40] — o aparecimento das diferentes emoções —, além da utilíssima e oportuna ‘memória’ que modificou o comportamento, puramente instintivo, para um comportamento organizado, com a racionalidade em desenvolvimento;  já sendo possível distinguir o que se apreciava mais e onde encontra-lo! Este hominídeo evoluindo do homo erectus ao habilis.

 

Por fim, o ápice da eficiência e do automatismo interligado, o córtex cerebral, elemento nobre que nos permite integrar e conscientizar o que preferimos ou desejamos, confrontando com o que devemos ou não realizar. O homo neandertalis, com volume cerebral de 1500 cc (desaparecido) e o homo sapiens sapiens, com volume cerebral de 1400 cc, atual e único representante desta espécie, cuja cérebro apresenta maior presença de circunvoluções e profundidade entre elas.

 

 

 

II. AS FASES DA MAÇONARIA E DOS MAÇONS

a) Maçonaria Operativa

 

Algo instintivo do tipo

SABER FAZER.

           

O homem maçom também partilhou de uma história cuja primeira etapa foi a definição de seu trabalho. Foi durante a Idade Média que uma espécie de organização no campo do trabalho ficou especificada e especializada. O referencial é a obra de Étienne Boileau (1200/1270), preboste de Paris que estabeleceu as regras para a execução das diferentes atividades[41],[42]: horário, local, resultado final, isto é, em qualquer atividade ou profissão, todos tinham que respeitar a mesma sequência e os mesmos materiais.

 

Neste ambiente viviam e trabalhavam os pedreiros, ainda denominados de lapidarius e cementarius, pois o termo ‘maçon’ aparece no século XII e o ‘freemason’ no século XIV[43]. O operativismo maçônico buscava um trabalho reservado, para aqueles que sabiam trabalhar com as pedras e uma remuneração condigna.

 

O marco associado com este ofício foi o aparecimento do estilo gótico de construção que exigia conhecimentos específicos, tendo como primeiro exemplar a Igreja de Saint Denis, em Paris, de 1137.

 

Estes pedreiros tinham jornada de trabalho relacionado com o inverno (menor) e verão (maior). No seu aparecimento as obras eram projetadas pelos religiosos, os poucos que sabiam ler, escrever e desenhar.

 

Os pedreiros se organizavam no trabalho tendo um líder, o chefe ou mestre da obra, para os orientar; eram obras — igrejas — monumentais que seriam trabalhadas ao longo de um tempo considerável, normalmente secular, gótico este caracterizado, entre outros elementos, pelos arcobotantes, vidraçaria rica e colorida, fachadas pinaculares[44],[45].

   

Catedrais

 

Foi necessário um esforço considerável e um tempo apreciável para que os pedreiros fossem os organizadores e projetistas de seus trabalhos — mas esta evolução se deu — e fiéis ou profanos viviam nas e para as igrejas — aliás, muitas vezes, estas maravilhas em pedra, eram espaços utilizados para outras atividades, como os negócios, visto que, nem sempre, tinham seu ambiente tomado pelos móveis que vemos em nossas igrejas: mas, muitas esculturas e poucos bancos; muitos espaços livres.

 

b) Maçonaria Especulativa

 

Algo emocional do tipo

GOSTAR DO QUE SE FAZ.

           

Diferentes fatores contribuíram para o abandono do estilo gótico: custo, demora, divisão da igreja — protestantismo, anglicanismo —, necessidade de outras construções. Tais elementos foram reduzindo as obras góticas e outras formas de construção apareceram: renascentista, barroco, neoclássico, modernismo.

 

A Inglaterra viveu um estímulo extra com a necessidade de reconstrução de Londres após o grande incêndio, em 1666. Contudo, os maçons acabaram aprendendo outras atividades e, mais importante, conseguiram se associar a outros saberes, de forma que ao longo do século XVII, operacionalizou-se uma transformação, uma evolução, um progresso no grêmio dos construtores.

 

As narrativas do processo são diversas — as Old Charges[46],[47],[48] — inicialmente com descrições simples — Poema Régio, 1390 —, conseguiram elaborar e enriquecer os relatos ao longo de um período transicional — 1717[49],[50] — com o aparecimento de uma organização que sabia o que apreciava, bem como estava munida de como concretizar uma nova atuação e concluir a tarefa.

 

Homens diferentes — construtores e pensadores — se reuniam em locais curiosos — ambiente de construções (lojas), pubs, tavernas, salas da nobreza — para, valendo-se da discrição ou do inusitado dos endereços, desenvolverem, trocarem e melhorarem as ideias em voga; cogitavam olhar o mundo por novos ângulos; trocar a teologia pela filosofia na formatação do racionalismo (Descartes, Spinoza) e do empirismo (J. Locke).

 

A novidade coube nos sulcos e circunvoluções desenvolvidas daqueles hominis de forma plena — J∴ e P∴ — facilitando a disseminação no mundo de então. Estudos (instruções) e práticas (ritualismo simbólico) se fizeram presentes, mas também uma transpiração para a sociedade de então que, nos altos escalões, resistiam a novidade, visto a probabilidade dos riscos frente a um esclarecimento amplo. 

 

Nos últimos três séculos esta foi a tarefa realizada com maior ou menor discrição. A evolução tomou novo ritmo e a disseminação do conhecimento pôs-se em curso com resultados fantásticos, basta comparar o saber e fazer dos séculos XVII e XVIII e os mesmos eventos nos séculos XX e XXI!

 

c) Maçonaria Executiva ou Corporativa[51],[52],[53]        

 

Algo mental do tipo

SABER QUE TEM QUE FAZER, GOSTAR E FAZER MESMO.

           

A realidade que nos rodeia exige posturas e atuações diferentes do período Especulativo; se então a discrição e a cautela eram necessidades elementares, hoje a presença atuante, concreta, contínua tornaram-se referenciais mais adequados, mais apropriados.

As mudanças estruturais da sociedade indicam a necessidade da presença do pensamento maçônico — seja através do velamento alegórico e, concomitantemente, a ilustração simbólica; ou ainda, a hierarquização da Liberdade, Igualdade e Fraternidade, como fundamentos invioláveis — mesmo nos mais díspares dos fractais componentes do mundo que construímos e conhecemos.

 

A presença concreta, não apenas dos ensinamentos maçônicos, mas do MAÇOM no meio social é o desafio de nosso tempo!

 

Nossa tarefa não é apenas a de proteger e transmitir a herança instrucional recebida, mas atuar esta herança no meio social, externamente ao ambiente maçônico da Loja.

 

Se os operativos necessitavam de força braçal para empilhar as pedras; se os especulativos precisaram organizar e comparar novos conhecimentos e saberes, para então, escolher o caminho; aos executivos/corporativos está sendo apresentada a tarefa de disseminar o conhecimento — o saber, o saber que se gosta —, através da prática, da atuação social.

 

A resistência presente é significativa, porém, este é o nosso tempo, esta é a nossa tarefa. Precisamos nos valer da herança biológica e cultural que recebemos e dela fazer uso frente as dificuldades da nossa prática, da nossa ação. Tivemos dois exemplos anteriores — os operativos e os especulativos —, agora é o nosso turno. Seremos capazes?

 

III. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Se por um lado a sobrevivência representa e exemplifica a tarefa pessoal e obrigatória de cada organismo na sua manutenção e proteção frente a fenomenologia físico-químico, multifatorial e sincronizado: isto é, a vida; por outro lado, existe a tarefa social, que em outros momentos desta caminhada evolutiva, partiu de poucos exemplares e hoje se encontra na casa dos bilhões.

 

Acredito que as considerações aqui apresentadas provenham das bases de alguma herança, da consciência e da memória e se valeram dos dados coletados ao longo das leituras para se converterem em pensamentos estruturados com a tentativa de expor estes diferentes arranjos em um todo de encadeamento e sentido; valendo para o conjunto de dados que se conseguiu guardar e organizar, outros irmãos poderão apresentar este conteúdo a partir de conteúdos diversos e com fechamento próprio.

 

Que o somatório do herdado e do adquirido possam ser utilizados em uma maior completude para que a fase atual da tarefa seja completada com adequação e vigor, pois Maçonaria continua sendo um assunto sério, talvez até mais sério frente aos desafios com os quais nos defrontamos e precisamos superar.

 

Luiz V. Cichoski, MM

ARBLS Templários da Liberdade, 69/Pinhalzinho

Grande Oriente de Santa Catarina

           

Conheça os livros do autor.

 

           

 

Notas de rodapé

[1] J. Langman, Embriologia Médica, 2ª. ed. Atheneu Ed. 1970.

[2] K. L. Moore, Embriologia Clínica, Ed. Interamericana, 1975.

[3] J. D. Watson, DNA, O Segredo da Vida, Cia de Letras, 2005.

[4] S. Mukherjee, O Gene, Cia de Letras, 2016.

[5] E. Mayr, Isto é Biologia, Cia de Letras, 2008.

[6] D. Kennedy, apresentador, A Célula Viva, Ed. Universidade de S. Paulo, s/d.

[7] L. E. Orgel, As Origens da Vida, EnB, 1975.

[8] D. Attenborough, A Vida na Terra, Martins Fontes/UnB, 1981.

[9] A. W. Ham, Tratado de Histologia, 6ª. Ed. Neuva Editorial Interamericana, 1969.

[10] F. R. Bailey & all. Histologia, MEC, 1973.

[11] DiFiori & all. Novo Atlas de Histologia, 3ª. Ed. Guanabara Koogan, 1977.

[12] A. L. Leninger, Bioquímica, Edgar Blucher, 1976.

[13] S. Goldberg, Descomplicando Bioquímica, ArtMed, 2ª. edição, 1998.

[14] A. C. Guyton, Tratado de Fisiologia Médica, 4ª.Ed. Guanabara Koogan, 1973.

[15] P. Champe & R. Harvey, Bioquímica Ilustrada, 2ª. Ed. Artes Médicas, 1997.

[16] B. A. Houssay, Fisiologia Humana, 4ª. Ed. L.El Atheneu, 1975.

[19] R. Dawkins, A Grande História da Evolução, Cia.de Letras, 2009.

[20] E. Wilson, A Criação, Cia de Letras, 2008.

[21] Bíblia Sagrada, versão King James, Edição Especial, No Esquadro, 2022.

[22] R. Leakey, Origens, UnB, 2ª. edição, 1981.

[23] R. E. Leakey, A Evolução da Humanidade, UnB, 1981.

[24] Ch. Darwin, A Origem das Espécies, Ilustrada, UnB, 1982.

[25] Ch. Darwin, A Descendência do Homem & a Sellecção Sexual, Liv. Edi. Marisa, 1933.

[26] M. Ridley, Evolução, 3ª. ed. Artmed, 2004.

[27] G. Haaf, A Origem da Humanidade, Abril Cultura, 1979

[28] A. Rutherford, O Livro dos Humanos, Ed. Record, 2020.

[29] R. J. Braidwood, Homens Pré-Históricos, EnB, 1975

[31] J. Ledoux, O Cérebro Emocional, Ed. Objetiva, 2ª. ed, 1998.

[32] J. Eccles, A Evolução do Cérebro, Inst. Piaget, 1989.

[33] L. Israël, Cérebro Direito, Cérebro Esquerdo, Inst. Piaget, 1995.

[34] H. S. DelNero, O Sítio da Mente, Collegium Cognitio, 1997.

[35] S. Pinker, Como a Mente Funciona, Cia de Letras, 1998.

[36] S. Pinker, Do que é feito o Pensamento, Cia de Letras, 2007

[37] A. Machado, Neuroanotomia Funcional, 2ª. Ed. Atheneu, 1998.

[38] F. H. Netter, Atlas de Anatomia Humana, Art Med, 1998.

[39] A. Damásio, O Erro de Descartes, Cia de Letras, 1996.

[40] A. Damásio, O Mistério da Consciência, Cia de Letras, 2000.

[41] G. B. Depping, Reglements sur les Arts e Métiers de Paris, rédigés au sec. XIII, et connus sur le nom du Livre des Métiers de Etienne Boileau.L’Imprièrie de Crapelet, Paris, 1837.

[42] R. Lespinasse, Histoire Générale de Paris, Les Métiers et Corporations de la Ville de Paris, XIIIe Siècle, Le Livre dês Métiers, D’Etienne Boilau,1879.

[43] L. V. Cichoski, Fundamentos Operativos nos Graus Básicos, A Trolha, 2012.

[44] J. Gimpel, Les Bâtisseurs de Cathédrales, Ed. Seuil, 1980.

[45] J. Heers, O Trabalho na Idade Média, Publicações Europa-América, 1965.

[46] L. V. Cichoski, Fundamentos das Old Charges, A Trolha, 2020.

[47] L. V. Cichoski, Legislação Maçônica – Old Charges, 1ª. parte, O Prumo, 221, mai/jun, 2015.

[48] L. V. Cichoski, Legislação Maçônica – Old Charges, 2ª. parte, O Prumo, 222, jul/ago, 2015.

[49] J. Anderson, As Constituições de Anderson, Ed. Juruá, 2001.

[50] R. F. Gould, As Quatro Lojas Antigas/1879, Arcanum, 2018.

[51] M. R. Barbosa Levy, O Dilema do Maçom, eBook, Amazon, 2020.

[52] L. V. Cichoski, Reflexão Conceitual: As Diferentes Maçonarias, O Prumo, 235, out/dez, 2017.

[53] L. V. Cichoski, Maçonaria Executiva, O Prumo, 253, nov/dez, 2020.

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