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A HARMONIA ENTRE O “FILHO PRÓDIGO”, O LÍDER E O VENERÁVEL MESTRE

Por: Geraldo Marcelo Lemos Gonçalves[1]

“Há uma diferença entre ser um líder e ser um chefe. Os dois são baseados em autoridade. Um chefe demanda obediência cega; um líder conquista sua autoridade por meio da compreensão e confiança.”

 Klaus Balkenhol[2]


A HARMONIA ENTRE O “FILHO PRÓDIGO”, O LÍDER E O VENERÁVEL MESTRE

Há parábolas que ultrapassam o tempo e penetram no âmago do espírito humano, iluminando não apenas a fé, mas também a ética, a conduta e a arte de conduzir. Entre elas, a do “Filho Pródigo”[3] resplandece como arquétipo da compaixão e da sabedoria, sintetizando o eterno reencontro entre a misericórdia e a justiça. De modo análogo, o líder de sucesso e o Venerável Mestre de uma Loja Maçônica encarnam, em diferentes planos, o mesmo princípio que rege essa parábola: o equilíbrio entre autoridade e amor, entre razão e perdão, entre a palavra que orienta e o silêncio que compreende (Figura 01).

 

O Pai da narrativa evangélica, sereno e magnânimo, é a representação mais pura da liderança espiritual. Ele não impede o filho de partir, pois entende que a liberdade é o primeiro degrau da sabedoria. Observa de longe, com o olhar compassivo de quem sabe que toda experiência, por mais amarga que seja, conduz ao aprendizado. Quando o filho retorna, arrependido e dilacerado pelo peso das próprias escolhas, o Pai o acolhe com ternura, não com censura. Esse gesto é a síntese da verdadeira maestria: o poder temperado pela misericórdia, a justiça revestida de amor. Tal como o líder e o Venerável devem fazer, o Pai age sem exaltar-se, corrige sem ferir e governa com a leveza de quem compreende que o dever de um guia é restaurar, e não punir.

 

Venerável Mestre dos Irmãos Pródigos

Figura 01: Venerável Mestre dos Irmãos Pródigos.[4]

 

O Filho Pródigo, por sua vez, é a imagem viva da alma humana em jornada. Ele simboliza o iniciado que se afasta da Luz, acreditando poder bastar-se a si mesmo, e que, ao experimentar o vazio das ilusões, descobre o verdadeiro valor do retorno. Sua trajetória espelha a do homem moderno, que muitas vezes se perde em ambições efêmeras até compreender que o verdadeiro progresso é interior. O líder sábio e o Venerável consciente reconhecem em cada ser humano um “filho pródigo em aprendizado”, alguém que precisa errar para despertar, cair para compreender e retornar para evoluir. Por isso, exercem a paciência e a clemência como virtudes indispensáveis à condução harmônica de qualquer grupo humano ou oficina maçônica.

 

O irmão mais velho da parábola representa o aspecto da justiça cega, da disciplina sem empatia, do zelo que se transforma em orgulho. Ele cumpre as regras, mas esquece o amor; obedece à letra, mas ignora o espírito. Essa é a tentação que ronda todo dirigente: confundir a ordem com a frieza, a autoridade com a rigidez, o comando com a vaidade. O Venerável Mestre, em sua elevação simbólica, precisa evitar esse equívoco. Sua missão é manter a balança em equilíbrio, unir a firmeza da lei à doçura do entendimento. Ele deve aplicar o esquadro sem perder o compasso, ensinar sem humilhar e corrigir sem romper laços fraternos.

 

O jovem que, movido pelo ímpeto da autonomia, exige a parte da herança e parte em busca do mundo, simboliza a inquietude de toda alma que, por vezes, se distância da Luz para compreender o valor da própria sombra. Seu retorno, marcado pela humildade e pelo arrependimento, encontra não o juízo severo, mas a acolhida magnânima do pai, cuja ternura não se corrompe pelo ressentimento. Essa atitude paterna é a verdadeira epifania do amor que compreende sem condescender, que perdoa sem fraquejar e que corrige sem humilhar.

 

Analogamente, o líder de sucesso, seja na sociedade profana ou nas instâncias iniciáticas, deve guardar em si essa rara capacidade de conjugar firmeza e compaixão. Sua autoridade não se ergue pela imposição do medo, mas pelo magnetismo do exemplo; não se sustenta pela retórica da vaidade, mas pela coerência entre a palavra e o gesto. Tal líder inspira, orienta e conduz, sem jamais olvidar que o poder, quando não temperado pela sabedoria e pela modéstia, degenera em tirania ou desordem.

 

No âmbito da Loja Maçônica, o Venerável Mestre, como presidente e condutor dos trabalhos, é chamado a manifestar esse equilíbrio em seu mais alto grau. Ele é o centro simbólico da harmonia, o ponto em que convergem as vozes dissonantes, as ideias diversas e os temperamentos que compõem o mosaico humano em um conclave de Maçons. O contraditório, inevitável nas assembleias e nos debates, não deve ser visto como ameaça, mas como instrumento de lapidação, tal como a fricção entre as pedras brutas que, pela paciência e pelo diálogo, se tornam polidas.

 

É justamente no contraditório que o Venerável revela sua verdadeira estatura moral. Quando confrontado por opiniões divergentes, deve agir como o Pai do Filho Pródigo: escutar antes de julgar, compreender antes de responder, acolher antes de corrigir. Seu silêncio ponderado vale mais que mil discursos inflamados; sua serenidade, mais que qualquer demonstração de autoridade. Assim como o Patriarca bíblico não negou a festa ao filho arrependido, o Venerável deve ser capaz de celebrar o retorno da concórdia após o tumulto das paixões.

 

Sua liderança, portanto, não se mede pela ausência de conflitos, mas pela arte de convertê-los em oportunidades de crescimento coletivo. Ele é o guardião do equilíbrio, o mediador entre a razão e o sentimento, entre a justiça e a misericórdia. Tal como o Pai que permanece à porta, à espera do filho perdido, o Venerável deve manter-se sempre disposto a reconciliar, a instruir e a reerguer, pois sabe que cada irmão, por mais distante que pareça, traz em si a centelha da mesma Luz que todos buscam.

 

O retorno do Filho Pródigo à casa paterna é a imagem da restauração da harmonia, o reencontro entre o homem e o seu princípio. Da mesma forma, quando uma Loja Maçônica encontra o eixo de sua serenidade, é porque seu Venerável governa com sabedoria, seus oficiais colaboram com lealdade e seus irmãos trabalham com sinceridade de propósito. Nesse instante, o Templo não é apenas um espaço físico, mas um reflexo da parábola divina: um local de reconciliação, estudo e elevação moral. Assim, o êxito de uma Loja não se mede pela quantidade de obreiros ou solenidades realizadas, mas pela qualidade da Luz irradiada de seu Oriente, que é a projeção direta da consciência e da retidão de seu Venerável.

 

Entre a parábola e o Oriente há um elo invisível, uma ponte simbólica sustentada por três colunas: Sabedoria, Amor e Justiça. O Pai da parábola manifesta essas virtudes ao agir com serenidade e clemência; o líder de sucesso as concretiza ao inspirar e servir; e o Venerável Mestre as corporifica ao unir autoridade e doçura, discernimento e humildade. O primeiro ensina o valor do perdão, o segundo a força da empatia, e o terceiro a arte de transformar o governo em exemplo. Quando essas três dimensões se entrelaçam, nasce o verdadeiro arquétipo do Mestre: o homem que domina a si mesmo para poder guiar os outros.

 

Em última análise, o Venerável Mestre é o ponto de convergência, entre o Pai que acolhe e o Filho que retorna. Ele compreende as fraquezas humanas porque também já foi peregrino da dúvida; perdoa porque sabe o peso do erro; orienta porque aprendeu a escutar. Sua grandeza não reside na autoridade ritual, mas na nobreza interior com que conduz os trabalhos, eleva os ânimos e preserva a harmonia das colunas. Sob sua direção equilibrada, a Loja floresce, o convívio se purifica e a obra maçônica atinge seu verdadeiro propósito: aperfeiçoar o homem para que ele, iluminado pela razão e suavizado pela virtude, possa contribuir para a edificação de um mundo mais justo e mais humano.

 

Assim, a parábola do Filho Pródigo, o ideal de liderança e o ofício do Venerável Mestre formam um triângulo de sabedoria. No vértice superior repousa a Luz do “Entendimento”, que reconcilia o homem com o divino; na base, a Força do Amor e da Justiça, sustentáculos de toda verdadeira fraternidade. E, quando o líder, seja ele espiritual, profano ou maçônico, compreende essa tríade, ele deixa de ser apenas um administrador de homens para tornar-se um construtor de almas, um verdadeiro artífice da harmonia universal.


Notas de rodapé

[1] Bacharel em Odontologia (UFVJM, 1999), Especialista em Odontopediatria (UFVJM, 2003), Especialista em Ortodontia (UFVJM, 2010), Especialista em Implantodontia (UNIASSELVI, 2013), Habilitação em Sedação Consciente e Analgesia Inalatória (ABRASCO, 2015), Especialista em Maçonologia: História e Filosofia (UNINTER, 2018), Bacharel em Administração de Empresas (UNINTER, 2022), Mestre em Prótese Dental (SLMANDIC, 2023). Mestre Maçom Instalado, Membro da A. R. L. M. Estrela Maior de Turmalina nº 243 do G. O. M. G., Membro Correspondente da A.R.L.S. Virtual Lux in Tenebris n° 47 da G. L. O. M. A. R. O. N., Grau 09 do R. E. A. A. e M. E. do Real Arco.


[2] Klaus Balkenhol (nascido em 6 de dezembro de 1939) é um renomado adestrador e ex-competidor de adestramento alemão, bicampeão olímpico. Ele é uma figura influente no esporte, conhecido por defender métodos de treinamento clássicos e pelo bem-estar dos cavalos.


[3] Evangelho de Lucas, capítulo 15, versículos 11 a 32.


[4] Imagem gerada por IA.

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