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A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL E A LITERATURA COMO INSTRUMENTOS DE TRABALHO DO MAÇOM CONTEMPORÂNEO – I

 Lucas V. Dutra[1]

Ivan A. Pinheiro[2]


A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL E A LITERATURA COMO INSTRUMENTOS DE TRABALHO DO MAÇOM CONTEMPORÂNEO – I

A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL E A LITERATURA COMO INSTRUMENTOS DE TRABALHO DO MAÇOM CONTEMPORÂNEO
Imagem ilustrativa gerada por IA

Já há tempos os autores têm se ocupado da inovação (organizacional, gestão, docência) e dos avanços tecnológicos enquanto vetores que, queiramos ou não, reverberam em meio à Ordem (Pinheiro, 2021, 2023a, b, 2025; Pinheiro e Dutra, 2025a, b; Pinheiro, Dutra e Filardo, 2025). A Inteligência Artificial (IA), por exemplo, em abordagem especulativa já foi estudada a partir das ideias e publicações de autores já consagrados (R. Kurzweil, Y. N. Harari, M. Nicolelis e outros), bem como matérias mais atualizadas veiculadas nas grandes medias no Brasil, muitas, reproduções dos originais publicados no exterior. De outro lado, os autores também têm se ocupado em desenvolver “ferramentas de trabalho” para o maçom contemporâneo, bem como explorar novos usos para fontes já existentes, como é o caso da Literatura no texto “A Literatura como Ferramenta para a Compreensão da Arte Real na Maçonaria Especulativa”, a ser publicado, em breve, pela Revista Ars Studiorum. Um ensaio sobre como a literatura pode iluminar a trajetória dos Iniciados pode ser visto em Norenberg (2025).

 

Por oportuno, importa destacar que tem sido crescente o emprego da IA na produção de textos de toda natureza e em todos os ambientes, o que certamente inclui a Maçonaria, seja ele (o uso) declarado ou não pelo autor e/ou percebido pelo leitor, o que revela a atualidade e a relevância do tema. Não obstante, e não sem razão (adiante voltaremos ao assunto), também já há veículos que restringem o seu uso, como foi o caso do recente Edital da Revista Ars Studiorum que no seu Termo de Ciência e Responsabilidade, firmado por todos os que submeteram trabalhos, estabeleceu: “Estou ciente de que é vedado o uso de tecnologias de inteligência artificial (IA) generativa ou preditiva como meio autônomo de elaboração do trabalho acadêmico, sendo proibida sua utilização com o fim de produzir, total ou substancialmente, o conteúdo do artigo”.  

 

Desta feita os autores combinam os seus 2 (dois) objetos de estudo e inauguram uma nova Série na qual, a partir da obra “A Morte de Ivan Ilitch” (Tolstoi[3], 2002), exploram os alcances e os limites da Inteligência Artificial para a pesquisa e a elaboração de trabalhos no contexto da Maçonaria. Metodologicamente foram adotados os seguintes procedimentos:

1.    a escolha de um prompt (instrução, comando, etc.) para a IA extrair da obra conteúdos pertinentes e de utilidade ao maçom;

2.    relatar a extração na forma de um ensaio com até 3 (três) páginas;

3.    a submissão do mesmo prompt a 3 (três) dentre as IA mais usuais e na sua versão gratuita, portanto sem recursos adicionais e potencializadores: Gemini 2.5 Flash, Grok e DeepSeek;

4.    os textos gerados, foram (serão) então incorporados aos textos autorais - sem ajustes (à exceção da formatação) ou correções, etc.


A Morte de Ivan Ilitch
Capa do livro A Morte de Ivan Ilitch

O que se segue, então, em cada texto da Série, são as análises e as considerações a partir dos achados de pesquisa que exploram, entre outros aspectos:

  • as semelhanças e as diferenças entre os textos gerados;

  • a existência de padrões estruturais, semânticos ou outros entre as versões;

  • o cruzamento de informações entre as respectivas versões;

  • as simulações a partir de pequenas mudanças introduzidas no prompt;

  • ainda que as versões gratuitas sejam natural e intencionalmente limitadas em recursos, entende-se que, mesmo sendo um exercício, não é possível deixar de tecer alguma apreciação crítica-comparativa. Entretanto, é importante ressaltar que mesmo as versões públicas quase diariamente são atualizadas com novos recursos que podem(riam), de um dia para outro, alterar o documento gerado e, por consequência, a apreciação ora referida; e, finalmente,

  • os autores apresentarão, em contraste, um texto produzido, efetivamente, a 4 (quatro) mãos.

 

Justifica-se, pois, a divulgação no formato “Série”: para evitar que o relatório de pesquisa (artigo) final ficasse demasiado extenso julgou-se conveniente dividi-lo. Assim, as análises e considerações serão crescentes: além de cada ensaio (gerado por IA) se fazer acompanhar dos comentários pertinentes ao texto per se, conforme sejam incorporados novos ensaios, as análises e considerações serão expandidas já em nível de agregação e comparação.  

 

A divulgação do prompt, logo a seguir, e que antecederá cada texto da Série, tem por objetivo estimular os leitores com índole investigativa:

  • a reproduzir os passos dos autores;

  • a promover variações sobre o tema (what if?);

  • a compartilhar os achados de pesquisa, em especial se gerados a partir de outras IA ou, se as mesmas listadas acima, potencializadas a partir de recursos só disponíveis em versões proprietárias; e, por fim, mas não menos importante,

  • a participar de uma rede estudos que leve a novas descobertas sobre os alcances e limites da IA aplicada à Maçonaria.

 

A primeira publicação, a seguir, foi gerada pela IA Gemini 2.5 Flash a partir do seguinte comando emitido no 10.11.25:

  • Elabore um ensaio de até 3 páginas sobre a obra literária “A Morte de Ivan Ilicht”, contendo duas partes. A primeira deve conter e justificar as cinco principais noções que determinam a importância da obra. A segunda deve realizar uma integração das noções contidas na primeira parte, que poderiam tornar esta obra literária uma ferramenta pessoal de aperfeiçoamento e conscientização para o Maçom, no que tange aos preceitos e valores da Ordem.

 

A Morte de Ivan Ilitch: O Espelho da Vida e a Busca pela Luz Interior

A novela A Morte de Ivan Ilitch, de Liev Tolstói, publicada em 1886, transcende a simples narrativa da agonia de um juiz de alto escalão. É uma profunda meditação sobre a existência, o propósito e a inevitabilidade da morte, servindo como um implacável libelo contra a superficialidade da vida burguesa do século XIX, que permanece incrivelmente atual. Sua importância filosófica e moral reside na sua capacidade de forçar o leitor a confrontar a pergunta central da vida de Ivan: “E se a minha vida inteira tivesse sido errada?”

 

Primeira Parte: As Cinco Principais Noções de Importância da Obra

A relevância duradoura de A Morte de Ivan Ilitch é sustentada por pelo menos cinco noções existenciais e morais cruciais.

 

1. A Hipocrisia da Vida "Correta" e a Alienação Social

A vida de Ivan Ilitch é caracterizada pela busca incessante da conformidade social[4]. Ele segue o roteiro estabelecido: casa-se por conveniência, ascende na carreira por vaidade e decora sua casa com base nas tendências da moda. O principal pilar da obra é a crítica à superficialidade: a vida de Ivan é "a mais simples e a mais comum, e, ao mesmo tempo, a mais terrível".

 

A importância desta noção reside no seu papel de crítica social atemporal. Tolstói revela que viver uma vida materialmente bem-sucedida, mas destituída de significado autêntico, é viver uma falsidade. Quando Ivan adoece, seus amigos e familiares veem sua doença e morte como meros inconvenientes sociais, jamais como uma tragédia existencial, expondo a frieza e a falsidade das relações baseadas na aparência.

 

2. A Inevitabilidade Existencial e o Silêncio da Morte

Um dos aspectos mais perturbadores é o silêncio em torno da morte. Ivan é atormentado pelo silogismo que aprendeu na juventude: "Todos os homens são mortais; Caio é um homem; logo, Caio é mortal." No entanto, ele nunca aplicou essa verdade a si mesmo. Sua importância reside na negação universal da mortalidade. Sua família e os médicos mentem e evitam o assunto, buscando manter uma fachada de normalidade.

 

Essa negação força Ivan à solidão incomunicável. O leitor é convidado a testemunhar essa negação em sua própria vida. A obra é, portanto, um lembrete veemente de que a morte não é um conceito abstrato ou algo que acontece "aos outros", mas o destino mais pessoal e inegociável.

 

3. O Sofrimento como Ferramenta de Conscientização

É apenas através da dor física e moral excruciante que Ivan é capaz de iniciar sua jornada de autodescobrimento. Ele percebe que o sofrimento não é um castigo, mas uma ferramenta purificadora que desmascara a futilidade de seu passado. O sofrimento torna-se o único caminho para a verdade.

 

A importância desta noção reside na inversão do valor da dor. A agonia de Ivan é o motor de sua consciência moral. A obra sugere que a verdadeira redenção ou "luz" só pode ser alcançada após o reconhecimento e a aceitação plena da miséria da própria existência equivocada.

 

4. A Figura do Servo Gerasim e a Simplicidade Autêntica

Em meio à hipocrisia, a única figura que oferece consolo e autenticidade é o servo Gerasim. Gerasim não teme a morte e trata a doença de Ivan com compaixão e naturalidade, em contraste com a artificialidade dos ricos. Ele oferece conforto físico e moral simplesmente por ser verdadeiro consigo mesmo e com o sofrimento alheio.

 

Esta noção sublinha a mensagem central de Tolstói: a salvação moral reside na simplicidade, na humildade e na capacidade de empatia desinteressada, qualidades perdidas na complexidade vazia da vida social de Ivan. Gerasim representa o ideal da vida não contaminada pela vaidade.

 

5. A Passagem da Treva para a Luz e a Redenção

O clímax da obra é a passagem da treva para a luz. Após três dias de luta agonizante, Ivan finalmente aceita que sua vida foi mal vivida. Nesse momento de rendição e libertação, ele sente que a dor cessa e vê "uma luz" no fim do túnel, transformando a morte em uma libertação espiritual.

 

A importância final desta noção é a possibilidade de redenção in extremis. Tolstói não oferece um caminho fácil, mas um caminho de reconhecimento moral. A morte, que era o maior horror, transforma-se no maior triunfo da consciência, provando que é o modo como se vive, e não como se morre, que define o valor de uma alma.

 

Segunda Parte: Integração e Aplicação para o Maçom

A jornada de Ivan Ilitch, do homem mundano alienado ao homem que encontra a luz na morte, oferece um roteiro poderoso de aperfeiçoamento pessoal e conscientização que ressoa profundamente com os preceitos e valores da Ordem Maçônica. O trabalho de Ivan sobre si mesmo, iniciado sob coerção da dor, é o trabalho que o Maçom se compromete a realizar voluntariamente sobre sua "pedra bruta".

 

Integração 1: Do Vício Social à Busca pela Verdade (Hipocrisia e Maçonaria)

A Hipocrisia da Vida “Correta” de Ivan serve como um alerta contra a Vaidade e a Aparência — vícios que a Maçonaria ensina a combater. O Maçom jura buscar a Verdade e viver segundo a Virtude, rejeitando o "mundo profano" que Ivan personifica. A obra lembra que a verdadeira elevação não está no título profissional ou na decoração da casa (as ambições vãs de Ivan), mas na construção de um Templo interior moralmente íntegro. A falência da vida de Ivan é a falência de um homem que construiu sua casa sobre a areia das convenções sociais, e não sobre a rocha dos princípios.

 

Integração 2: Consciência do Tempo e da Mortalidade (Silêncio da Morte e Maçonaria)

A Inevitabilidade Existencial é um preceito central na Maçonaria, simbolizada pela Ampulheta e pela Foice do Tempo. O Maçom é constantemente lembrado de que o tempo é escasso e que o trabalho de "desbastar a Pedra Bruta" deve ser feito agora. A negação da morte por Ivan e seus pares é o exato oposto da vigilância que a Ordem exige. Ao confrontar A Morte de Ivan Ilitch, o Maçom é compelido a não esperar pela dor física para se conscientizar de que não é apenas "Caio" quem é mortal, mas ele próprio, acelerando a urgência do aperfeiçoamento moral.

 

Integração 3: O Cinzel da Dor e o Autoconhecimento (Sofrimento e Maçonaria)

O Sofrimento como Ferramenta de Conscientização é análogo ao trabalho simbólico com os instrumentos. A dor excruciante de Ivan funciona como o Cinzel e o Malho quebram a crosta da ilusão profana. A Maçonaria prega o Conhece-te a ti mesmo, mas o caminho é frequentemente difícil e doloroso, exigindo a demolição de velhos hábitos e egos. O Maçom pode ver na agonia de Ivan a dureza necessária para transformar o erro em verdade, aceitando que a verdadeira Luz só vem após a introspecção mais severa e honesta.

 

Integração 4: O Valor da Simplicidade e Fraternidade (Gerasim e Maçonaria)

A autenticidade de Gerasim é o modelo de Fraternidade e Humildade que a Ordem Maçônica busca incutir. Gerasim trata Ivan com genuína caridade e compaixão, sem esperar recompensa social ou profissional. Ele não julga o doente; ele o ampara. A solidão incomunicável de Ivan é o resultado de uma vida sem laços fraternos verdadeiros. A Ordem, ao colocar os Irmãos no mesmo nível, independentemente de sua posição social no "mundo profano", visa criar uma rede de apoio que previna a solidão existencial de Ivan, baseada na Ajuda Mútua e no amor fraternal desinteressado.

 

Integração 5: A Busca pela Luz Interior (Passagem da Treva para a Luz e Maçonaria)

O momento final de Redenção e Luz de Ivan é a mais direta aplicação maçônica. A Luz é o objetivo final do trabalho maçônico — a Gnose, o conhecimento da Verdade e a união com o Grande Arquiteto do Universo. Ivan Ilitch, no fim, abandona a Treva de sua vida egoísta e, ao aceitar a verdade de seu erro, encontra a paz e o Esclarecimento moral. A obra ensina que a elevação espiritual não é um rito externo, mas um ato de consciência interno, o último e mais importante passo no desbaste da Pedra Bruta, culminando na unificação com o princípio superior, simbolizada pela visão de luz e a superação do medo da morte.

 

Em síntese, A Morte de Ivan Ilitch funciona como um Livro das Constituições existencial. Ela não apenas ilustra o que acontece quando os princípios da Virtude, da Fraternidade e do Autoconhecimento são negligenciados, mas também dramatiza o difícil, porém recompensador, caminho da Iniciação Existencial — o reconhecimento de que, para se viver uma vida plena, é preciso antes de tudo estar preparado para morrer bem.

           

(continua no próximo número)

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

NORENBERG, Mateus. O Idiota - Você já se sentiu um idiota por ser justo ou verdadeiro? Freemason, 07 nov. 2025. Disponível em https://www.freemason.pt/o-idiota/. Acesso em 09.11.25.

 

PINHEIRO, Ivan A. O copo está meio cheio ou meio vazio? In: MORAIS, Cassiano Teixeira de (Org). Maçonaria Pós-Pandemia. Brasília, DF: CMSB, 2021, p. 139-157.

PINHEIRO, Ivan A. Modelo Geral de Análise & Interpretação Simbólica – MGA&IS. Bibliot3ca Fernando Pessoa. 16 jul. 2023a. Disponível em https://bibliot3ca.com/15764-2/. Acesso em 10.11.25.

 

PINHEIRO, Ivan A. A Associação que Abriga a Loja Maçônica – um espaço à criatividade, alcances e desdobramentos gerenciais. Freemason, 17 ago. 2023b. Disponível em https://www.freemason.pt/a-associacao-que-abriga-a-loja-maconica/. Acesso em 09.11.25

PINHEIRO, Ivan A. Inteligência Artificial – ser ou não ser, eis a questão. Freemason, 25 mar. 2025. Disponível em: https://www.freemason.pt/inteligencia-artificial-ser-nao-ser-eis-a-questao/. Acesso em 09.11.25.

 

PINHEIRO, Ivan A.; DUTRA, Lucas V. Em Busca de uma “Pedagogia” Maçônica. In: AMVBL – Academia Maçônica Virtual Brasileira de Letras (Org.). Os Desafios da Maçonaria na Contemporaneidade – tecnologia, olhares e impactos na sociedade. Brasília, DF: Independently Published, 2025a, p. 24-54.

 

PINHEIRO, Ivan A.; DUTRA, Lucas V. Tecnologias e Dilemas Morais. Freemason, 02 abr. 2025b. Disponível em https://www.freemason.pt/tecnologias-e-dilemas-morais/. Acesso em 09.11.25.

 

PINHEIRO, Ivan A.; DUTRA, Lucas V.; FILARDO, José. O Repto da Modernização e a Arte Real. In: AMVBL – Academia Maçônica Virtual Brasileira de Letras (Org.). Os Desafios da Maçonaria na Contemporaneidade – tecnologia, olhares e impactos na sociedade. Brasília, DF: Independently Published, 2025, p. 55-81.

 

TOLSTOI, Leon. A Morte de Ivan Ilitch. Porto Alegre: L&PM, 2002. ISBN 85.254.0600-7.


Notas de rodapé

[1] Mestre Maçom do Quadro da ARLS Presidente Roosevelt, 75, GLESP, Or. de São João da Boa Vista, Psicólogo, Professor Doutor em Psicologia, Especializado em Maçonologia (UNINTER), e-mail: dutralucas@aol.com.

[2] Mestre Maçom, Pesquisador Independente, e-mail: ivan.pinheiro@ufrgs.br.

[3] 1828 -1910.

[4] Nota dos autores: os destaques constam no original do ensaio gerado pela IA.

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