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LITURGIA, RITO E RITUAL

Izautonio da Silva Machado Junior



LITURGIA, RITO E RITUAL


LITURGIA, RITO E RITUAL

Os vocábulos Liturgia, Rito e Ritual são usados com frequência na maçonaria, no entanto muitas vezes mal aplicados e menos ainda compreendidos.


O QUE É LITURGIA

Liturgia (do grego leitourgia), significa serviço, ação, trabalho ou serviço público. Nesse sentido, não visa a utilidade particular, mas a comunidade.


A liturgia pode ser conceituada como um conjunto de atos preordenados para o desempenho de um serviço público, cujo objetivo é estabelecer uma ordem coerente dos mesmos, de modo a propiciar que os assistentes percebam qual a finalidade da cerimônia que está sendo realizada.


A liturgia pode ser de ordem social ou religiosa

Assim é que existem no plano social diversas formas de liturgias. Por exemplo, no Poder Judiciário, quando se estabelece uma sequência de atos ordenados que têm por escopo promover a Justiça; ou em uma inauguração de edifício público, onde os atos solenes realizados buscam demonstrar ao público que aquela construção terá uma importante finalidade social.


Do mesmo modo, na esfera religiosa existem as formas de liturgia. Por exemplo, as missas católicas e os cultos judaicos, onde se pretende, através de uma ordem de atos cerimoniais e rituais, transmitir os conceitos e sentimentos religiosos que fomentam a fé e orientam os devotos a seguir os seus princípios.



Interessante anotar que no Antigo Testamento da tradução grega da Bíblia (Bíblia dos Setenta), o vocábulo “liturgia” é designativo do serviço de culto do Templo de Jerusalém. Somente mais tarde é que o termo passou a se referir também às celebrações cristãs.



OS TIPOS DE LITURGIA

  • a liturgia cerimonial (da cerimônia)

  • a liturgia ritual (do rito)


Enquanto a cerimônia é o nome atribuído às formas exteriores de um ato, o

rito se relaciona com os aspectos essenciais do ato.


O objetivo central da liturgia cerimonial é transmitir a sensação de ordem e beleza, através das formas exteriores dos atos praticados.


O objetivo central da liturgia ritual é transmitir os elementos essenciais, a expressão dos mitos e símbolos, a interiorizar nos participantes os conteúdos iniciáticos.


Por exemplo, um Sacramento do Batismo Católico.


A liturgia cerimonial pode ser identificada pelos atos de entrada do sacerdote, pelos objetos ou pelas vestes usadas (ordem e beleza).


A liturgia ritual está na essência do ato em si, que ocorre quando o sacerdote molha com água a cabeça do batizado, consagrando-o na fé cristã (aspecto simbólico).


Trazendo esses conceitos para uma sessão maçônica:

A liturgia cerimonial pode ser observada em elementos exteriores, como o sentido da circulação em loja, as músicas tocadas, a procissão de entrada, a formação de abóbada de aço, os títulos das autoridades maçônicas, a posição de sentar, o local de se paramentar etc.


A liturgia ritual pode ser identificada em atos como a abertura e o fechamento da loja, a disposição das Grandes Luzes (Esquadro, Compasso e Livro Sagrado), a verificação pelo Cobridor se o Templo está coberto, as provas da Iniciação, os sinais, toques e palavras etc. Todos estes são elementos simbólicos e iniciáticos, essenciais da liturgia.


O QUE É RITO

A palavra rito (do latim ritus) significa “ordem prescrita” ou “ordem estabelecida”, e traduz um uso ou costume aprovado.


Os Ritos são formas de expressão de um mito

Os mitos são uma das fontes de transmissão da Tradição; mito significa tradição, história. (...) Originalmente, antes do período grego clássico, os mitos serviam para representar em uma ordem as realidades de uma ordem diferente, e são, portanto, símbolos. No caso da Maçonaria, as lendas que são representadas em diferentes graus têm este caráter de mito- símbolo. (...) Todos os mitos têm dois aspectos: o exotérico e o esotérico; eles geralmente relacionam eventos épico-heroicos relacionados aos deuses ou aos homens, seja se referindo à criação do mundo ou à origem e desenvolvimento da comunidade onde esses mitos ocorrem. Seu significado é hierático e simbólico, procurando, sobretudo, instruir (não divertir) e comunicar um conhecimento concreto e profundo, para transmitir uma influência espiritual. A narração de mitos torna possível ensinar o que não é possível descrever com os recursos dialéticos usuais e, neste sentido, sua função é análoga à da parábola. (DAZA, 1997, pág. 261 e 262).


A maçonaria se estrutura em torno de mitos, como por exemplo:

  • a transição das Trevas para a Luz (Iniciação)

  • a Construção do Templo de Salomão

  • a Lenda do Terceiro Grau



O mito é o coração de um rito, pois este se estrutura de modo a expressar aquele.


Historicamente, alguns dos primeiros ritos conhecidos foram os primitivos Ritos adivinhatórios e os Ritos sacrificiais, onde se pretendia influenciar as forças invisíveis e as divindades por meio de oferendas ou homenagens.


Com o tempo, foram se desenvolvendo, de um lado, os ritos sociais, como o casamento e o funeral, e de outro lado os ritos religiosos, por meio de cerimônias e cultos.


Mistérios de Elêusis

Na Iniciação aos mistérios de Elêusis, se colocava uma chave de ouro sobre a língua dos Iniciados, chave esta que simbolizava o Silêncio e o Segredo.


O mistagogo colocava uma chave de ouro sobre a língua dos Iniciados, sem exigir juramento, isso estava implícito naquele ato simbólico, e a punição a quem quebrasse o silêncio sobre o mistério era o banimento, o confisco de bens e a proibição de ser sepultado na terra natal (horrível na época).



Além disso, os iniciados de Elêusis saíam do antro onde se encontrava o leito de Perséfone (deusa das ervas, flores, frutos e perfumes) com um dedo sobre os lábios para significar que o que tinham experimentado era inefável, ou seja, indizível, indescritível.


Os ritos possuem um aspecto exterior, manifestado pela liturgia cerimonial, e um aspecto interior, exprimido pela liturgia ritual.


Em termos maçônicos, o rito é um método de conferir a luz maçônica, e se vale para esse objetivo de uma coleção de graus, onde cada um deles contém uma etapa de conhecimento e progresso nos estudos. Os ritos determinam o conjunto de diretrizes gerais pelas quais se praticam as sessões, e por intermédio do qual se expressam os elementos da Ordem.


De acordo com Alec Mellor, a terminologia maçônica se inspirou na Tradição da Igreja Católica, que se divide em 6 (seis) ritos: Latino, Bizantino, Armênio, Antioqueno, Caldeu e Alexandrino.


Os ritos maçônicos se distinguem entre si pela forma, e possuem pontos fundamentais em comum, que são uma síntese da essência da maçonaria.


Os ritos são meios alternativos de se alcançar o mesmo objetivo, de transmitir o conteúdo iniciático da maçonaria.



Os vários Ritos, embora diferentes em sua estrutura externa, mantêm uma linha convergente e positivamente semelhante, já que os três primeiros graus são comuns a todos os Ritos. Portanto, existem apenas interpretações diferentes dos mesmos elementos simbólicos, que ao longo do tempo apareceram na forma de um Rito, embora todos eles mantenham o núcleo iniciático que é comum e tradicional na Maçonaria (já que o que muda na maioria dos casos é apenas a liturgia do Rito e não sua essência simbólica). (DAZA, 1997, p. 325)


OS RITOS E SUAS VERSÕES

As versões se dão por meio de diferenças rituais dentro de um mesmo rito, que é o mesmo em todo caso. É uma questão de forma, e não de conteúdo.


Como dissemos, é possível que a maçonaria tenha se inspirado na terminologia da Igreja Católica, que possui ritos. O Rito Latino, adotado pela Igreja Católica Apostólica Romana, possui também os seus rituais, como a missa, o casamento, a crisma, o natal, o batismo etc., mas dentro do próprio Rito Latino, existem outros que compartilham os seus mesmos elementos essenciais, que são os Ritos Romano, Ambrosiano, Moçárabe e Galiciano (ou Lionês).


Fazendo comparação com a maçonaria, podemos ver que o mesmo ocorre com seus diversos ritos.


O REAA varia na forma como é praticado nos diversos países, e mesmo dentro de um mesmo país. No Brasil, vemos variações entre as potências simbólicas, como as formas adotadas pela CMSB, GOB e COMAB, sendo que no GOP-SP ainda existe o “REAA Francês”, cujos rituais são diferentes dos demais.


Também no Rito de York isso ocorre, na medida em que as Grandes Lojas americanas adotam variações do mesmo rito. No Brasil, a maioria das potências seguem o modelo da Grande Loja de Nova York, mas também encontramos variações em nosso país, como a GL da Paraíba, que adota o modelo de Nevada.


Em todos os casos, se trata do mesmo rito, com os mesmos princípios essenciais, mas com variações nas práticas rituais.


OS RITOS MAÇÔNICOS PRATICADOS NO BRASIL

O Brasil é um dos países onde a maçonaria pratica maior quantidade de ritos diferentes. Em nosso país, os ritos praticados pelas potências reconhecidas são os seguintes:

1. Rito Escocês Antigo e Aceito

2. Rito de York (Americano)

3. Rito de Schröder

4. Rito Adonhiramita

5. Rito Francês ou Moderno

6. Rito Brasileiro

7. Rito Joanita

8. Rito Escocês Retificado

9. Ritual de Emulação (“Rito de York” do GOB).


Além desses, há outros ritos que são adotados por potências não reconhecidas, como por exemplo o Rito de Memphis-Misraim.


O QUE É RITUAL

Não devemos confundir liturgia (cerimonial e ritual) com rito e com ritual. A palavra ritual (do latim ritualis), isoladamente, possui outros significados:

 Como adjetivo, Ritual designa o que é relativo a ritos.

 Como substantivo, designa o livro que contém a ordem e a forma de determinada cerimônia, das dramatizações e representações ritualísticas.


O rito prescreve o conjunto de princípios gerais, enquanto que o ritual é um conjunto de regras estabelecidas para a liturgia das cerimônias maçônicas.


Em analogia com termos jurídicos, o rito pode ser comparado a uma “Lei” (um conjunto de preceitos e obrigações gerais), e o ritual pode ser comparado a uma “Instrução Normativa” (que regulamenta como essa Lei deve ser observada e praticada).


Como substantivo, ritual é o livro que serve como “manual de procedimentos”. Chamamos de Ritual o livro que usamos nas sessões, pois ele contém as fórmulas e instruções necessárias à prática uniforme e regular dos trabalhos, como por exemplo a fórmula ritualística de abertura e fechamento de uma sessão.


  • O rito é gênero, o ritual é espécie.

  • O rito é “continente” (contém), o ritual é “conteúdo” (está contido naquele).

  • O rito é estático, o ritual é dinâmico.


Cada rito maçônico pode conter vários rituais, como o Ritual de Consagração de Templo, os Rituais de Iniciação, Passagem e Elevação, o Ritual de Cerimônia Fúnebre, o Ritual de Loja de Mesa, os Rituais de abertura das sessões etc.


Os ritos fazem uso da liturgia (cerimonial e ritual) para alcançar a finalidade de transmitir o seu conteúdo iniciático e simbólico, e também fazem uso dos rituais, para organizar os seus procedimentos nas sessões e cerimônias.


O rito sem liturgia é inerte, sem vida.


FONTES DE PESQUISA

ASLAN, Nicola. Grande Dicionário Enciclopédico de Maçonaria e Simbologia. Londrina: Editora

Maçônica “A Trolha”, 2012.

DAZA, Juan Carlos. Diccionario de La Francmasonería. Madrid: Ediciones Akal, 1997.

ISMAIL, Kennyo. O que é Rito e o que é Ritual. Blog No Esquadro, 2013. Disponível em https://www.noesquadro.com.br/termos-e-expressoes/o-que-e-rito-e-o-que-e-ritual/. Acesso em 09 de maio de 2020.

MELLOR, Alec. Dicionário da Franco-Maçonaria e dos Franco-Maçons. São Paulo: Martins Fontes, 1989.

MENDES, Fábio. Ritual de Emulação – O grau de Aprendiz Maçom. Sorocaba: Edição do Autor, 2011. MUNIZ, André Otávio Assis. Curso Elementar de Maçonologia. São Paulo, Richard Veiga, 2016.


Leia o livro: INTRODUÇÃO AO RITO DE YORK: AS BLUE LODGES




 
 
 

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