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TESTAMENTO MORAL E FILOSÓFICO

 

Por Geraldo Marcelo Lemos Gonçalves[1]

Vanderlei Coelho[2]

 

TESTAMENTO MORAL E FILOSÓFICO


TESTAMENTO MORAL E FILOSÓFICO
Imagem ilustrativa gerada por IA

No Rito Escocês Antigo e Aceito, antes da iniciação, o candidato é convenientemente preparado para a cerimônia e conduzido à Câmara de Reflexões (ou Câmara das Reflexões).

 

O postulante deve escrever seu Testamento Moral e Filosófico, refletir, séria e profundamente, sobre a vida e sobre sua decisão de ingressar na Maçonaria. Entregue às suas próprias meditações, ele não estará só, pois Deus, que tudo vê, será testemunha de sua sinceridade. Conforme a seguir[3]:

Em presença de Deus, após ter refletido séria e profundamente sobre os símbolos que me deparam à vista, e, sendo meu ardente e sincero desejo morrer para os vícios e preconceitos sociais ou de educação do mundo profano, lego à minha vida passada os erros e defeitos morais que me oprimem a consciência, renunciando às minhas vaidades humanas, pedindo perdão àqueles que porventura feri, voluntária ou involuntariamente, com o meu egoísmo e a minha intolerância, e perdoando aqueles que com ou sem justa razão, em qualquer momento, tenham voltado contra mim seus espíritos irascíveis, para, desse modo, poder transformar-me em um verdadeiro construtor social.

E por assim ser, passo a responder leal e francamente às questões filosóficas que esta associação de homens livres e de bons costumes de mim exige, e à qual me disponho pertencer e servir, dando a conhecer os meus deveres de cidadão honrado e digno.

 

Então, o candidato deverá responder livremente às seguintes perguntas[4]:

1.      Quais são os vossos deveres para com Deus?

2.      Quais são os vossos deveres para com a Humanidade?

3.      Quais são os vossos deveres para com a Pátria?

4.      Quais são os vossos deveres para com a Família?

5.      Quais são os vossos deveres para com o próximo?

6.      Quais são os vossos deveres para convosco?

 

MEU TESTAMENTO

 

Adaptação do texto “Para lembrar-se de mim”, autor Robert M. Test[5].

 

Um dia, um médico atestará a falência do meu cérebro e, essencialmente, o fim da minha vida. Nesse instante, a biologia declarará silêncio onde antes havia pensamento, emoção e sonho.

 

Quando esse momento chegar, peço que não tentem prolongar o que já cumpriu seu ciclo natural. Não introduzam em meu corpo o sopro artificial de máquinas que apenas estendem o tempo, mas não devolvem o sentido. A vida deve ser respeitada em sua dignidade, e a morte, aceita como parte de um mesmo caminho.

 

Em vez disso:

 

Doe meus olhos a um homem que nunca viu o sol nascer, o rosto de um bebê ou o amor no olhar de uma mulher. Que ele possa enxergar, através de mim, a beleza que o mundo guarda em cada amanhecer;

 

Doe meu coração a quem o seu próprio não fez senão causar dias infindáveis de angústias. Que esse órgão, um dia movido por sonhos e ternuras, continue a pulsar em outro corpo, levando consigo um pouco da minha humanidade;

 

Doe meus rins àquele que depende de uma máquina para manter-se vivo semana após semana. Que meu corpo sirva à continuidade de outro, e que o sofrimento seja, por um instante, aliviado;

 

Doe meu fígado àquele que luta contra o veneno do próprio sangue, cuja vida se esvai pela falência desse órgão silencioso e vital. Que ele encontre, em mim, a chance de recomeçar, e que, ao sentir o vigor retornar, saiba que dentro de si pulsa a gratidão de uma vida compartilhada;

 

Doe meu sangue, meus ossos, cada músculo e cada nervo, encontre um modo de transformar tudo isso em movimento, em esperança, em futuro. Que, por meio de mim, uma criança volte a andar, um ancião recobre a força, um jovem retome a alegria de viver;

 

Explore cada canto do meu cérebro e de minhas células. Use o que eu fui para compreender o que o ser humano ainda pode ser. Que minha matéria sirva à descoberta, à cura e ao avanço da ciência. Que um menino mudo possa, um dia, gritar o gol de seu time, que uma menina surda ouça o som da chuva na janela de seu quarto;

 

Doe o que restar para algum laboratório de anatomia, para que os profissionais da saúde aprendam a cuidar melhor dos vivos com a ajuda do meu corpo já imóvel. Que eu sirva, ainda que sem voz, ao aprendizado daqueles que buscam preservar a vida.

 

E, se quiserem enterrar algo, que sejam minhas culpas, minhas fraquezas e os feitos dos quais não tenho orgulho.

 

Que as flores cresçam sobre a lembrança do que em mim houve de amor, e não sobre as marcas do que me faltou compreender.

 

Entreguem meus pecados à misericórdia divina, pois só o “Deus do meu coração” conhece o peso e o propósito de cada escolha que fiz.

 

E confiem minha alma a Ele, não como quem a perde, mas como quem a devolve.

 

Se quiserem lembrar-se de mim, não o façam com lágrimas, mas com gestos: uma palavra boa, uma mão estendida, um perdão concedido.

 

Cada ato de bondade será um modo silencioso de me manter vivo.

 

Alegrem-se quando a ciência vencer uma enfermidade, pois saberão que meu corpo colaborou com essa vitória.

E se um dia a dor da minha ausência for grande, lembrem-se: toda vida que se doa multiplica-se em outras formas de existir.

 

Se você fizer o que eu pedi, eu viverei para sempre e transcenderei a morte.

 

Viverei em cada respiração alheia, em cada descoberta, em cada olhar que volta a ver.

 

Porque transcender é continuar não no tempo, mas no bem que se deixa.

 

Esse é o meu testamento.

 

Esse é o meu desejo.


Notas de rodapé

[1] Bacharel em Odontologia (UFVJM, 1999), Especialista em Odontopediatria (UFVJM, 2003), Especialista em Ortodontia (UFVJM, 2010), Especialista em Implantodontia (UNIASSELVI, 2013), Habilitação em Sedação Consciente e Analgesia Inalatória (ABRASCO, 2015), Especialista em Maçonologia: História e Filosofia (UNINTER, 2018), Bacharel em Administração de Empresas (UNINTER, 2022), Mestre em Prótese Dental (SLMANDIC, 2023). Mestre Maçom Instalado, Membro da A. R. L. M. Estrela Maior de Turmalina nº 243 do G. O. M. G., Membro Correspondente da A.R.L.S. Virtual Lux in Tenebris n° 47 da G. L. O. M. A. R. O. N., Grau 09 do R. E. A. A. e M. E. do Real Arco.


[2] Doutor Honoris Causa pela UNISCECAP de Brasília – DF; Pós-Graduado em Gestão de Pessoas; Gestor Empresarial; Palestrante; Especialista em Educação Corporativa; e Projetista.

Idealizador do Maçonaria com Excelência; Delegado do Grão-Mestre da GLOMARON, Região 1A; Grau 33 do REAA; Mestre Instalado pela Loja de São João nº 33; Presidente de honra da Academia Maçônica de Letras de Rondônia; Membro Efetivo da Academia Maçônica Virtual Brasileira de Letras; Membro Efetivo da Academia de História Militar Forte Príncipe da Beira; Membro da Loja Lux in Tenebris; Fundador da Loja Luz e Conhecimento; e Condecorado com a Comenda Jorge Teixeira de Oliveira, maior honraria outorgada pela GLOMARON.


[3] GLOMARON, Grande Loja Maçônica do Estado de Rondônia. Ritual do Grau de Aprendiz Maçom. Porto Velho: 2016.


[4] Idem.


[5] TEST, Robert N. To remember me. The Cincinnati Post, Cincinnati, 1976. Seção de Opinião.

2 comentários


QQ∴HH∴ Ler este texto me proporcionou um profundo salário espiritual, pelo qual expresso minha sincera gratidão.

Em tempos em que, no Uruguai, foi aprovada a Lei de Morte Digna, este testamento ressoa com ainda mais legitimidade e valor. Suas palavras tocam não apenas a razão, mas também o coração do Aprendiz que busca compreender o sentido da vida, da morte e da perpetuação do bem.

Recebam um T∴A∴F∴ do Oriente de Montevidéu,

Apr∴ José Trifoglio

Loja Ariel – Grande Loja da Maçonaria do Uruguai

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Gratidão, querido Irmão José Trifoglio. Estamos sempre aprendendo, é também nossa missão compartilhar e ensinar o que aprendemos.

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