ROMÃ: ORIGEM, MITOLOGIA E SIMBOLISMO NA MAÇONARIA
- 2 de jul.
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Por Luiz V. Cichoski
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ROMÃ: ORIGEM, MITOLOGIA E SIMBOLISMO NA MAÇONARIA

I. APRESENTAÇÃO
A Romã é uma fruta diferente com algumas particularidades que a torna uma fruta única e própria, isto é, de uma espécie particular; obviamente uma planta (reino vegetal), inserida no reino Myrtales, dentro do filo Magnolyophita, ramo familiar Lythraceae, espécie Punica granatum da classe Magnoliopsida, cientificamente denominada Punica granatum.
Sua composição principal e sumarizada guarda relação com muitas outras frutas nas quais a água é o principal componente (83%). Considerando os constituintes das diferentes famílias químicas, encontramos os carboidratos como a frutose e a glicose; dentre as vitaminas foram encontradas as vitaminas do complexo B (B5/ácido pantotênico, B6/piridoxina e B9/ácido fólico), vitamina C e vitamina K; entre os minerais são encontradas diferentes quantidades de potássio (K), cálcio (Ca) e Ferro (Fe) e, obviamente o seu caracterizador, a antocianina, um fenólico vermelho.[1]
Com semelhante composição química pluralizada guarda um potencial farmacológico que necessita uma maior especificação — posologia, horários — para obtenção de um real efeito fitoterápico.
A criatividade humana em sua associação de conceitos e imagens sempre foi marcante, quanto menor o conhecimento, maior a presença compensatória da intuição. Sua origem — descontando a evolução —, teria sido o sangue de Dionísio (deus do vinho), e por isso a fruta não era ingerida nas refeições. A romã foi associada, simbolicamente, com a fecundidade e com a vida, portanto, útil no tratamento da infertilidade e presente nos arranjos das noivas como um bom agouro e declaração reprodutiva. Paradoxalmente, também é conhecida como a ‘fruta da morte’, visto haver condenado Perséfone ao mundo de Hades, por haver ingerido algumas doces sementes, refeição que a condenou a retornar cada ano ao reino dos mortos, provocando o inverno — a tristeza de sua mãe, Ceres —, e nunca tendo podido engravidar![2]
O Cristianismo, a partir de São João da Cruz, simbolizou na romã as incontáveis ‘perfeições divinas’; mas o próprio fruto circular servia para referendar a infinitude do Universo, assim como os mistérios de Deus e a própria Igreja contendo todos os cristãos (grãos) em uma única crença (a fruta).[3],[4] Aqui um exemplo da transformação simbólica de uma antiga crença nos deuses greco-romanos transmutados no seio do catolicismo cristão.
A Bíblia Sagrada menciona, em pelo menos 16 vezes, a fruta romã; em sua maioria na intimidade do Antigo Testamento e sempre em um ambiente simbolizador de prosperidade, abundância, progresso e beleza; como segue[5]:
a) primeira menção em Ex 18, 33 “Farás também romãs de azul, púrpura e carmesim, e de linho fino torcido, ao redor da orla do manto; e entre elas, campainhas de ouro no meio; uma campainha de ouro e uma romã, outra campainha de ouro e outra romã, ao redor da orla do manto”.
b) simbolizando a Terra Prometida: Dt 8,8 “É uma terra que produz trigo e cevada, uvas, figos e romãs, azeite e mel. É uma terra onde nunca faltará comida ou qualquer outra coisa para vocês, uma terra onde as pedras têm ferro e as montanhas têm minas de cobre. Vocês terão toda a comida que precisarem e louvarão o SENHOR, nosso Deus, pela boa terra que lhes deu”.
II. A ROMÃ NA MAÇONARIA
A proximidade da Maçonaria Operativa com a Igreja Católica é fato inquestionável, além de concreto no ambiente das igrejas góticas do século XII e XIII.
Igrejas que funcionavam em um ambiente extremamente amplo, iluminado e ilustrado, tal qual, um livro de infinitas páginas; cada parede, cada coluna, cada arco de janela, cada contorno era ilustrado por esculturas que revelavam o que, muitas vezes, não era entendido na homilia pelo uso do latim nas cerimônias.
Podemos vislumbrar o resultado deste aprendizado e dedicação; aprendizado que encontrou complemento ao longo do século XIV e seguintes — ver Old Charges.
O desafio deixou de ser erguer pedras, mas elevar a compreensão de tudo que fora feito e o que se estava fazendo no século XVII[6], que culminou na obra Especulativa. Materiais diferentes para Maçons diferentes.
A herança pétrea foi estudada e ampliada com os novos pensamentos racionalistas e empiristas.
O simbolismo especulativista ganhou espaço próprio, amplo e incansável ao substituir a simbolização arquitetônica e escultural. Foi possível entender o que era dito ou escrito, além de também escrever e dizer o que era a Maçonaria no âmbito deste simbolismo de ilustrações, símbolos, ideias e palavras.
Foi descoberto e entendido que a Romã fazia parte da Maçonaria Operativa e transformou-se em herança simbólica na Maçonaria Especulativa. O que havia ficado oculto na linguagem pouco acessível — o latim —, transformou-se em obra melhorada e expandida com as palavras de cada Loja — inglês, francês, alemão... e até português.
Podemos ingressar no Templo e saber — independente da língua — quais as ideias ganharam representação em ‘cada parede, cada coluna, cada arco de janela, cada contorno ilustrado’.
A decoração inicial da Loja — cuja primeira experiência concreta foi a de 1776/Londres; qual a sua decoração?! Estaria presente a romã? Vista por A. Mellor, que a descreve como um símbolo de origem bíblica presente nestas construções, visto que:
“O Ocidente, ou entrada da loja, era emoldurado por duas colunas ‘ocas’, encimadas por romãs entreabertas, cujas sementes intimamente unidas simbolizam os membros da grande fraternidade maçônica espalhados pela superfície do globo”.[7]
Observar que há Lojas apenas com as romãs nas Colunas interiorizadas no adro do Templo; há Lojas que revestiram estas Colunas com globos celestes e temos, entre nós no Brasil, uma Coluna embelezada pelo globo terrestre e com o globo celeste, tendo na base destas colunas inúmeras romãs, — como inúmeros devem ser os Maçons e suas Lojas.
Este símbolo, por vezes esquecidos ou não notado, foi mencionado por autores como J. Boucher e Abrines/Arderiu, que ali reconheceram a Maçonaria representada, nos grãos da Romã, mergulhados numa polpa transparente, simbolizam os Maçons unidos entre si por um ideal comum. Sendo a casca da raiz da romãzeira tóxica, como já dissemos, a Romã nos mostra ainda os Maçons saídos de um mundo mau por essência e elevando-se a um estado de excelsion.[8],[9]
Entre os autores e professores que se dedicaram a esta história e saber, vemos que Aslan[10] — um dos pioneiros — tinha uma visão ampla do símbolo e sua história:
a romã é um símbolo herdado da Bíblia que teria erigido este simbolismo a partir da Arca de Noé que é representada por tal fruta que guarda no seu interior as sementes — casais para a nova povoação da Terra e a concretização de uma nova humanidade.
Complementa dizendo:
“Dos hebreus, que a usaram de maneira mística no Templo, passou para os Maçons que a adotaram como Símbolo de abundância, para a qual se adapta muito bem por causa da intumescência e como fruta carregada de grãos”[11] um texto semelhante temos em R. Ricard.[12]
Não diferente o entendimento de J. Casttelani, que até mesmo é capaz de ampliá-lo, sendo até mesmo, contundente ao dizer que:
“Romãs já estavam presentes junto ao capitel, ou seja, na parte superior do fuste das Colunas do Templo de Jerusalém, em duas fileiras, com duzentos frutos cada uma. Nas Colunas do pórtico do Templo Maçônico, são encontradas romãs entreabertas, onde os grãos simbolizam os Membros da grande fraternidade maçônica, espalhados pela face da Terra; os grãos, reunidos em grupos, que é separado de outros grupos por uma tênue película, mostra, também que embora divididos em Obediências e países, todos os Maçons fazem parte do mesmo corpo, simbolizado pela romã inteira. O símbolo é de origem bíblica”.[13]
“Essas frutas com grãos dispostos simetricamente lembram a família maçônica, cujos membros estão todos harmoniosamente unidos pelo espírito de ordem e fraternidade”. “Essas frutas com grãos dispostos simetricamente lembram a família maçônica, cujos membros estão todos harmoniosamente unidos pelo espírito de ordem e fraternidade[16]”.
III. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A romã e a romanzeira — para alguns, romeira — ganhou proporção histórica, simbólica e maçônica por ser uma espécie presente nos ambientes — palestina e crescente mesopotâmico —, cuja história serviu de base para o desenvolvimento daqueles povos e de seus herdeiros, no caso, a Maçonaria Especulativa.
Se ficássemos apenas com os dizeres de Santos — “Romãs, Balaustrada — fruto da romãzeira cujo interior se divide em cavidades que contém pequenas sementes com suco de sabor agradável”[17] — teríamos uma visão puramente vegetal ou frutífera. Mas a Maçonaria, mais especialmente seus componentes, dilataram este conhecimento, associando um saber histórico a um saber agrícola e ainda acrescido de uma compreensão simbólica que ganhou arremates de detalhes importantes de irmãos que se dedicam a este saber, conhecimento e ensino.
Viver e construir a Maçonaria no século XXI não se basta com o saber passado que esteve nas mentes de poucos pensadores dos séculos iniciais; a evolução produzida pelo homem bem como o seu saber, está sendo fantástico e não tem previsão de pausa ou redução! Os Irmãos maçons já perceberam que estamos em um novo mundo, com necessidades diferentes, saberes diferentes, condutas diferentes que merecem ser conhecidas, desenvolvidas e aplicadas ao mundo todo, não apenas ao ambiente templário interno.
A tarefa é hercúlea, mas os instrumentos e meios são amplos e facilitadores; precisamos nos preparar para uma participação na construção do nosso mundo muito mais que admirarmos a construção feita pelos Irmãos que nos antecederam! A romã vai ser símbolo de irmandade trabalhadora, da acomodação de muito saber, algo como um pen drive simbólico. Mas Maçonaria sempre foi um assunto sério.
LUIZ V. CICHOSKI M∴M∴
ARBLS Templários da Liberdade, 69
Pinhalzinho/SC
GOSC
Conheça os livros do autor.
Notas de rodapé
[1] E. Whitney & S. R. Rolfes, Nutrição, volumes 1 e 2, 10ª Edição, Cengage/Learning, 2008.
[2] P. Wilkinson & all. O Livro da Mitologia, Ed. Globo, 2018.
[3] J. Chevalier & A. Gheerbrat, Dicionário de Símbolos, 2ª. edição, J. O. Editora, 1989.
[4] J. E. Cirlot, Dicionário de Símbolos, 3ª. Edição, Centauro Editora, 2005.
[5] Bíblia Sagrada, trad. Pe. Antonio Pereira Figueiredo, Ed. Barsa, 1971.
[6] L. V. Cichoski, Histórias Paralelas, inédito.
[7] A. Mellor, Dicionário da Franco-Maçonaria e dos Franco-Maçons, Ed. M. Fontes, 1989,
[8] J. Boucher, A Simbólica Maçônica, Editora Pensamento, 1979.
[9] Frau Abrines & Arderiu, Diccionario Enciclopedico de la Masonería, T.I, Ed. Kier, 1962.
[10] N. Aslan, Grande Dicionário Enciclopédico de Maçonaria e Simbologia, V. IV, 2ª. Ed. A Trolha, 2000.
[11] Texto Original: “De los Hebreos, que la usaban misticamente em el Templo, pasó a los Masones, quienes la adoptaron como el símbolo de la abundancia, para el cual se adapta perfectamente por su fruto turgente y abundante em semillas”. A. G. Mackey, Enciclopedia de la Francmasonería, vol. II, Ed. Grijalbo, 1874.
[12] R. Richard, Dictionnaire Maçonnique, Dervy, 2002 - Symbole de fécondidaté, comme celui des fruits à nombreux pépins, ses graines identiques et rangées symétriquement peuvent représenter les Maçons, étroitement unis comme doivent l’être les membres d’une famille nombreuse.”
[13] J. Castellani, Dicionário Etimológico Maçônico, P-Q-R-S, 2ª. Edição, A Trolha, 2002.
[14] D. Ligou, Dicitionnarie de la Franc-Maçonnerie, 2ª. édition, Quqdrige/PUF, 2012.
[15] O. Wirth, La Franc-Maçonnerie rendue Intelligible à ses Adeptes, vol. I, L’Apprenti, Dervy, 1975.
[16] Tradução: "Ces fruits aux grains sumétriquement rangés rappellent la famille maçonnique, dont tous les membres sont harmonieusement reliés par l’esprit d’ordre et de fraternité”.
[17] S. D. dos Santos, Dicionário Ilustrado de Maçonaria, 2ª. Ed, 1990.




Que obra maravilhosa meu irmão!